
― Está escuro aqui... Eu a ouvi, mas estava com sono demais para dar atenção. ― Escuro... muito escuro! Sobressaltado, finalmente acordei com a voz falando na minha cabeça, como quem é importunado por um despertador inconveniente em plena madrugada. Por falar em relógio, virei o corpo na direção do criado mudo e chequei as horas. Passava um pouco das duas da manhã. Olhei ao meu redor e vi que o quarto estava vazio. A parca luz da varanda no andar de baixo, que sempre ficava acesa, era a única fonte de iluminação que me permitia enxergar qualquer coisa, principalmente meus pertences espalhados pelo chão; uns que haviam caído da minha mochila de viagem na pressa para me jogar na cama e dormir. Tinha chegado naquela mesma noite de uma competição, na qual fui campeão. O que já era um costume, modéstia à parte. O único barulho que escutava era o das cortinas que dançavam levemente ao ritmo da brisa que soprava lá fora. ― Está frio. Estou me sentindo tão sozinha... ― Ouvi Andreia falar de novo, soando chorosa e trêmula. ― Pelo amor de Deus, Andreia! O que você está fazendo na piscina a uma hora dessas? Está bêbada? ― mentalizei, levantando-me da cama e conversando com a minha irmã sem emitir nenhuma palavra, como costumávamos fazer sempre. Era a forma como melhor conseguíamos nos comunicar. O silêncio do outro lado foi perturbador. Todas as vezes em que Andreia usava aquele tipo de comunicação era porque tinha algo a dizer. Algo importante ou íntimo. O silêncio era algo bem incomum vindo dela. Porém, também era incomum que ela me chamasse àquela hora. Intrigado, desci as escadas da casa e fui até o quintal onde ficava a piscina. Para a minha surpresa, não havia ninguém lá. ― Andreia, onde você está? ― Frio... ― foi tudo o que ela disse. ― Andreia, me diga onde você está que vou te buscar ― inseri um pouco de autoridade na voz, como se ela fosse uma criança desobediente. Porém, estava mais preocupado do que queria admitir. ― Não vai dar. Não vou aguentar por muito tempo. ― Aguentar? Do que está falando? Enquanto me comunicava com ela, começava a pegar as chaves do carro e correr para o lado de fora da casa. ― Andreia, fala comigo! Onde você está? ― Não posso mais... Não posso! Novamente veio o silêncio. Daquela vez, de alguma forma, eu soube que ela não iria voltar. Dentro do carro, sem nem ter chance de dar a partida para começar a procurá-la, senti uma terrível agonia, como se parte do meu coração estivesse sendo arrancado do peito, dilacerando minha alma. Sentia, bem lá no fundo, que o elo fora quebrado definitivamente. Algo havia mudado para sempre.